quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Segredos, Confissões e o Lado Negro da Força


Esta postagem na verdade tem por inspiração a afirmação/pergunta retórica que a moça do Dermatilomania normalmente faz quando menciona segredos e diários. Citando a própria: “não consigo entender por que as pessoas têm segredos”. Ela é coerente a ponto de nos entregar o seu próprio diário e dizer: “leiam”. Sério.
Eu, claro, tenho que ser do contra, e provavelmente vou ser xingada por isso, mas sou obrigada a discordar. Acho que segredos são justificáveis, e até necessários algumas vezes. 

Certamente os nossos segredos são responsáveis por uma boa parcela de sofrimento na nossa vida. Ninguém guarda para si um segredo sem sentir o mínimo de frustração, seja porque ele nos pertence, é particular da nossa natureza ou das nossas ações – portanto nossa “CULPA” -, seja porque é de outra pessoa e nós sofremos por ela não poder trazê-lo à luz e resolvê-lo sem se sentir vexada.
Quanto aos segredos alheios, não há o que fazer a não ser guardá-los. Ou não, caso você seja um filho-da-puta fofoqueiro nato.

Ou se interesse por se juntar ao Rancho do Riso da Foca Fofoca.

Mas de que tipo de segredo se fala? No meu dicionário Aurélio, “segredo” tem 5 acepções e todas elas são tão genéricas que não vale nem a pena discorrer sobre isso. 
Vamos adotar o conceito de que segredo é algo pessoal (restringindo um pouco mais as opções) do qual não se fala abertamente por razões diversas.

Para ser mais específica, vou reduzir ainda mais o escopo: esse “algo pessoal” pode ser uma opinião honesta (sobre algo ou alguém), uma linha de pensamento, um traço da natureza ou da personalidade do indivíduo, uma condição física/patológica (deformidades, doenças, síndromes, distúrbios,...), uma ação feita ou situação passada (condutas questionáveis, traumas, lembranças ruins,...), por exemplo.

Por "razões diversas" podemos entender, com freqüência, “vergonha”, “culpa”, “medo” e “preservação”. Claro, isso de uma forma generalizada, pois as razões sempre remetem a uma gama bem mais ampla e complexa de motivos. 

Preservação da sanidade, diga-se de passagem.

Quando o segredo diz respeito a uma condição física ou patológica ele dificilmente prevalece; mas é um bom exemplo de “segredo prejudicial” do qual a Ana fala. Em determinado ponto a própria pessoa procura ajuda e acaba por se “denunciar”. Nada mais justo. 
Uma adolescente grávida que não conta sua condição para seus pais tem medo das reações, mas algum dia seu segredo inevitavelmente vai se mostrar ao mundo. 
Uma pessoa com uma doença terminal pode não informar seus entes queridos para preservá-los da dor; mas em algum momento essa pessoa deverá ser internada, e então não haverá segredo. 
Doenças relacionadas ao sexo se prestam perfeitamente a esse tipo de discussão: quanta gente por aí que não conta nem ao médico sobre uma DST porque tem vergonha de admitir que a tem? (Aliás, sei não... acho que tem gente por aí que tem vergonha até de admitir que tem órgãos genitais.) Daí a coisa evolui de tal modo que só amputando. 

"Santa infestação! Você foi atingido pelos demônios do cabelo! Não há tempo a perder! Vou ter que amputar!"

Também existem os segredos relacionados a ações feitas e situações passadas, os quais eu exemplifiquei com “condutas questionáveis”, “traumas” e “lembranças ruins”, e eles também tem esse caráter prejudicial à pessoa que os guarda. 
Sim, “condutas questionáveis” se aplica a políticos corruptos que fazem alguma maracutaia e, claro, mantêm a boca fechada; mas confesso que pensei nesse termo infeliz para descrever, por exemplo, aquelas vezes em que alguém precisou de ajuda e você simplesmente virou a cara, porque não sabia como reagir ou porque não era com você. Talvez não seja bem um segredo, mas a maioria das pessoas não alardeia sobre esses momentos em que a própria moral falha. 
Mais ou menos por aí estão as “lembranças ruins”, outro termo não muito inspirado (¬_¬) que eu usei para os momentos em que você fez algo basicamente vergonhoso, cometeu alguma gafe da qual a mera lembrança lhe causa mal-estar. 
Já os “traumas” são um tipo de lembrança ruim causada principalmente por fatores externos, mas que ainda assim lhe dão vergonha e mal-estar. Provavelmente a solução mais evidente para questões desse tipo seja a de procurar um profissional, psicólogo/psiquiatra, para discuti-las e aliviar o peso morto que elas constituem para a pessoa.

Pensando bem, faz todo o sentido eu gostar de KareKano...

 Mas os tipos de segredo sobre os quais eu realmente gostaria de falar são os que eu considero mais justificáveis (e mesmo necessários) do que nocivos: os segredos relacionados a traços individuais e a opiniões. Se você diz que não tem segredos, eu sugiro que pare e pense de novo, olhando sob essa perspectiva.

Você mantém em segredo sua opinião 100% honesta sobre alguém considerado querido porque não quer feri-lo, não quer perder a amizade e não quer ser demonizado como o jornalista alemão que decidiu só falar “a verdade”. A “verdade” além de algo que é, muitas vezes, arbitrário, não costuma agradar à maioria. Um bom exemplo é a campanha de uma certa marca de cerveja, que infelizmente não mostra também a versão contrária, das mulheres falando o que elas pensam de verdade. >:)

Claro, falo de um exemplo baseado na minha experiência. Não considero meus amigos perfeitos, por mais que goste deles. Você também não acha seus amigos perfeitos, ou não brigaria com eles ou se irritaria de vez em quando.  
Desde meus primórdios de blogueiragem anuncio a quem quiser ouvir que minha característica mais marcante é a autoconsciência/autocrítica, o que significa que, justamente por esse egocentrismo, passo grande parte do tempo ocupada me analisando e, principalmente, me criticando e me culpando e me envergonhando. Se você é capaz de ligar os pontos, entende que o julgamento que eu faço de mim vale para aqueles com os quais convivo. Inclusive o julgamento negativo
Talvez seja uma estratégia de sobrevivência; eu antecipo as críticas porque morro de medo de ser julgada e criticada – não que antecipar as críticas evite que as pessoas ignorem meus defeitos, isso é impossível. :P

Então, sim, sou rígida nas minhas opiniões acerca das pessoas. 
Que valor tem isso para elas? Faz diferença eu dizer que me incomodo por esta ou aquela característica de alguém? Eu acredito que não – quando alguém decide mudar, o faz por algum tipo de motivação interna, por uma iniciativa que vem de dentro; e não pela opinião de um terceiro, que nunca vai entendê-lo ou aceitá-lo completamente. 
Então mantenho em segredo esse tipo de pensamento. São poucos os que sabem lidar com uma crítica. Eu não sou uma dessas pessoas, e acho que é muito mais agradável ignorar alguns defeitos alheios em defesa do outro, pelo bem-estar da relação, até porque algumas críticas só servem mesmo para alimentar alguma insegurança do indivíduo, quando o que você quer de um amigo seu é justamente encorajá-lo a seguir em frente.

Também acho justificável os segredos acerca da própria natureza. Eu me vejo como uma pilha de defeitos imperdoáveis. Posso enumerá-los de forma geral, mas tenho uma vergonha infinita de exemplificá-los e especificá-los diante de qualquer indivíduo – íntimo ou não. Posso dizer, por exemplo, que normalmente invejo certas pessoas, mas dizer quais pessoas e por que as invejo é simplesmente doloroso de mais para que eu consiga expor publicamente esse sentimento nem um pouco bonito, construtivo ou frutífero. 

Masami Tsuda me entende e entende meu eensy weensy monster.

Acredito que todos tenham os seus demônios, o seu lado negro da força, o seu pedacinho de Voldemort, o seu Álvaro de Campos que enrola publicamente os pés nos tapetes da etiqueta, por mais íntegros que pareçam. É justamente esse lado patético/maléfico que acaba soterrado pelo nosso esforço em manter os defeitos no fundo do baú. Isso é necessariamente ruim?
Provavelmente essa é só uma crença minha para tentar apaziguar essa minha vergonha de existir, não ter a capacidade de atingir a perfeição e achar, em um acesso de puberdade fora de época, que posso apontar para os outros e encobrir os meus defeitos com os alheios.